E TE CHAMAVAM MARIA... – TEXTO 15


       Vimos no artigo anterior que o Anjo esclarece a Maria sobre a missão que é chamada a viver a partir dessa realidade da maternidade, dom supremo. A tudo isso ela responde declarando-se ‘serva do Senhor’. Mais que um simples ato de humildade, trata-se do reconhecimento, conforme o Antigo Testamento, de sua função de realizar um chamado em sua vida, apesar de sua condição de mulher simples e normal, que fará parte do plano divino da salvação, assim com fez Abraão, Moisés, Josué, David, os profetas... Jesus tomará para si esse mesmo título de ‘Servo do Senhor’ com todas as suas consequências, como acompanhamos nos dias de Sua Paixão e a liturgia nos lança ao coração da imagem do ‘servo sofredor’ de Isaias. Fazendo eco ao que viverá o Filho, a Mãe se antecipa: “Faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1,38). Em liberdade, depois de certo silêncio, ela dá o seu assentimento. E aqui não está em jogo apenas uma busca de santificação pessoal, mas o início de uma nova etapa da relação entre Deus e o ser humano. Como sempre, Deus não realiza essa história de salvação sozinho, mas pede a livre colaboração humana.
       Maria não se fecha em si mesma: “O consentimento de Maria é um profundo ato de fé. A Virgem ouvinte da Palavra é a Virgem crente no amor fiel de Deus. Maria sabe que não se entrega à vontade fria e impessoal de um Deus que lhe dita ordens à distância. Adere às disposições do Deus que a ama pessoalmente. Tanto é assim que o prometido ‘Deus-conosco’ é agora o ‘Deus-comigo’, aquele que está em seu coração e em seu seio. A fé de Maria não é, em primeiro lugar, a aceitação de verdade, nem o acatamento de preceitos morais. É, antes de mais nada, uma atitude de vida. No reconhecimento pleno de Deus, que atua realmente em sua vida e na obediência à sua vontade, essa fé expressa em sumo grau a atitude crente da Virgem”  (Angel L. Strada – Maria: um exemplo de mulher – Ave Maria).
       Assim, no dizer de Ambrósio, bispo de Milão, Maria corrige o erro de Zacarias, a incredulidade, ao tempo que revela a sua personalidade. Uma fé sem fissura, sua modéstia, seu pudor e sua prudência. Não nos é difícil perceber esse ambiente de silêncio que se instala nesse diálogo do Anjo com Maria. Ela permite que essa Palavra vá entrando em seu coração, sem precipitar-se com opiniões pessoais. Senhora de si, ela acolhe em seu interior toda essa revelação. Na sua liberdade, compromete-se em seguir o plano traçado por Deus para a sua vida. No que Deus lhe pede ela encontrará a sua realização pessoal e a felicidade autêntica e plena que o ser humano só encontra no próprio Deus.
       É importante tomar consciência de que essa atitude de entrega de Maria ao plano divino tenha se dado como decisão radical no momento da Anunciação do anjo. Ela já trazia em si uma história da ação da graça e da disposição pessoal em se consagrar ao Senhor. O que ela deseja vem ao seu encontro, e ela se decide, em sua liberdade, tornar efetiva a sua entrega. Só nesse âmbito podemos compreender a sua prontidão em responder ao chamado e ao mesmo tempo encontrar a plena liberdade em sua dependência filial.

       Não podemos esquecer que o anjo ofereceu a Maria um sinal do que Deus é capaz de realizar: Isabel, sua parenta, acabava de conceber em sua velhice. O que em Isabel vinha por via ordinária, em Maria se dava de maneira extraordinária. São caminhos diferentes para um mesmo objetivo: a salvação que Deus quer oferecer a humanidade. Assim damos um passo mais adiante nessa caminhada que estamos fazendo com a Virgem, para que a nossa devoção seja um reconhecimento contemplativo desse instrumento divino para nossa salvação que se fez serva não de modo passivo, mas como uma verdadeira cooperadora da salvação humana em livre fé e obediência. Nos encontraremos com Maria e Isabel. Até lá!