E TE CHAMAVAM MARIA – 32


A primeira e mais fundamental afirmação do dogma católico sobre Maria é a maternidade divina. A própria Sagrada Escritura o atesta na narrativa da Anunciação, na visita a Isabel, do próprio Paulo que reconhece a vinda do Filho de Deus através de uma mulher e com isso a preexistência do mesmo Filho. Que entra na nossa história em igual processo humano através de uma mulher e Maria é eleita para essa missão excepcional. Isso é história.
Essa maternidade de Maria sempre esteve presente na Tradição. No Credo, na doutrina dos Santos Padres, na fé do povo. Essa fé na maternidade divina de Maria é consequência da própria compreensão do mistério de Cristo num processo de proteção e enriquecimento recíprocos. É no século V que esse processo alcança um dos seus pontos culminantes.  Temos a discussão se Maria teria gerado tão somente o homem Cristo ao qual, posteriormente o Verbo se teria unido (Nestório, bispo de Constantinopla desde 428, é o principal expoente desse pensamento). Tal pensamento negaria a realidade da Encarnação, significando uma espécie de justaposição e não verdadeira união.
A escola de Alexandria (São Cirilo), reage contra a doutrina de Nestório e assim, o Concílio de Éfeso, realizado em 431, rejeita tal doutrina e confirma que é um e o mesmo aquele que é gerado pelo Pai desde a eternidade e aquele que nasceu da Maria como homem. Assim, pode se afirmar que Maria é Mãe de Deus, porque Cristo é verdadeiro Deus e é verdadeiro homem na realidade de um único sujeito pessoal: o Verbo. Assim declara o Concílio: "Porque não nasceu primeiramente um homem comum, da Virgem Santa, e depois desceu sobre ele o Verbo. Porém, unido desde o seio materno, diz-se que se submeteu a nascimento carnal como alguém que faz seu nascimento da própria carne... Dessa maneira, (os Santos Padres) não acharam inconveniente chamara a Virgem Santa de Mãe de Deus”. Anos depois, o Concílio de Calcedônia, 451, reafirma a mesma doutrina.
É importante compreender nesse processo do termo Mãe de Deus, aplicado à Virgem, que “Maria não é e nem pode ser mãe da natureza divina. Mas, por geração humana, é realmente mãe de um Filho que é Deus. Não porque seja mãe de um homem que se une a Deus, mas porque, desde o instante da sua concepção, seu Filho é pessoalmente Deus. O fato de Maria não entregar a seu Filho a natureza nem a personalidade divina em nada obscurece a profundidade e a realidade de sua maternidade. Nenhuma mãe confere a seu filho a alma e, sem embargo, é realmente mãe, não só do corpo que gera, mas de toda a pessoa. De maneira semelhante, Maria não é mãe unicamente do corpo de Jesus, mas é Mãe do Filho de Deus” (Angel L. Strada – Maria: Um Exemplo de Mulher – Ave Maria).
Como toda criança que vem a esse mundo, Cristo foi dado à luz, alimentado e cuidado pela Virgem, como toda criatura em sua dependência materna. Foi ela que “fez o Cristo falar, Maria que fez Jesus caminhar”, se relacionar com demais, introduziu na religiosidade do seu povo, nessa lenta aprendizagem que faz parte do nosso ser humano. É assim que intuímos nas palavras de Jesus, a influência dessa maternidade, presente nas suas parábolas, nesse olhar para o feminino em suas atividades, como destaca Lucas. “Para Nossa Senhora ser mãe significa ser educadora de um filho o qual, mesmo sendo Filho de Deus, nasce e cresce humanamente, e se desenvolve em sabedora e graça diante de Deus e dos homens (Lucas 2,52). Como observa muito bem um estudioso, ‘a maternidade de Maria pertence ao mistério da Encarnação. Nesse mistério, a maternidade de Nossa Senhora expressa a inserção mais perfeita do Filho de Deus na humanidade, quer dizer o que existe de mais encarnado na própria Encarnação. Nesse sentido, o título Theotókos representa o ponto mais alto da Encarnação’”  (Vitor Groppelli – Maria, a Igreja e o povo – Ave-Maria).
A maternidade divina de Maria é a base e o princípio fundamental da teologia marial. Esta na origem dos demais dogmas marianos. Todas as graças, privilégios e títulos de Maria estão fundamentados nesta verdade mariana. Ainda temos algumas outras coisas a dizer. Até o nosso próximo encontro.