E TE CHAMAVAM MARIA – 33



É verdade que a encarnação é uma iniciativa divina, mas isso não quer dizer que nesse processo Maria seja um instrumento passivo. Os textos bíblicos que nos são oferecidos enfatizam a sua entrega pessoal, nesse caminho de livre obediência de quem leva Cristo mais no coração do que no ventre (Sto. Agostinho). Com seu ‘sim’ Maria torna-se o primeiro membro do Corpo de Cristo com uma função específica: ser mãe. Nesse exercício da maternidade ela O acolhe e passa a ser a primeira redimida, iniciando o tempo da salvação. Sim, a histórica salvífica precisou desse ‘sim’ para acontecer. Maria imprimi sua maternidade na história salvífica, que se expressa como dom e tarefa, com todo o desdobramento e desenvolvimento na fé de tal ato. Ela acolhe e atua em plena consciência de quem cresce no movimento claro-escuro do caminhar na fé. Maria tem consciência que Jesus é Filho de Deus, mas teve que viver na esperança da fé que aguarda a Sua manifestação ao mundo quando da Sua missão. O Vaticano II nos lembra na LG 58 que Maria ‘avançou no caminho da fé’.
A comunhão de Maria a Cristo nesse processo salvífico de ser membro e atuar como mãe, lança a sua maternidade para além de uma exclusividade dando-lhe uma dimensão universal que abrange todos os tempos e a totalidade dos seres humanos. A todos aqueles a quem toca a salvação de Cristo, chega a maternidade de Maria, como natural consequência da sua maternidade divina. Maria está associada permanentemente à pessoa e obra do Salvador. Ela é mãe do Cristo total, Cabeça e membros. Não uma maternidade fictícia, mas real e permanente. “A maternidade de Maria, na economia da graça, perdura sem cessar, desde o consentimento que ela prestou fielmente na anunciação e manteve sem vacilar ao pé da cruz, até a consumação final de todos os eleitos. De fato, depois de elevada ao céu, ela não abandonou esta missão salutar, mas, pela sua múltipla intercessão, continua a obter-nos os dons da salvação eterna. Com seu amor de Mãe, cuida dos irmãos de seu Filho, que ainda peregrinam e se debatem entre perigos e angústias, até que sejam conduzidos à Pátria feliz. Por isso, a bem-aventurada Virgem é invocada, na Igreja, com os títulos de Advogada, Auxiliadora, Amparo e Medianeira. Mas isto deve entender-se de modo que nada tire nem acrescente à dignidade e à eficácia de Cristo, Mediador único” LG 62.
Ainda nesse campo da maternidade de Maria, desde os primórdios já se lançava sobre Maria um paralelo de oposição com a primeira mulher: Eva, mãe de todos os viventes. Se em Eva, o pecado e a morte entram na história humana, por Maria entra a vida e a graça. Faz-se um paralelo entre a obediência de Maria, fé e disponibilidade, e a desobediência de Eva, falta de fé e desobediência. Assim, Maria é a Mãe dos novos viventes, dos nascidos da graça de Cristo, restaurando o que Eva havia destruído. É aqui que vamos encontrar em Santo Irineu, interpretando em contraposição entre Maria e Eva, o fato desse nó da desobediência de Eva na história salvífica ter sido desatado por Maria, em sua obediência.
Assim, desde sempre, Deus já havia pensado e desejado essa participação de Maria na história salvífica, para unir-se a Seu Filho nessa obra de redenção, sendo a primeira redimida, não somente como mãe, mas também como sócia (M. J. Nicolás). Se a maternidade significa uma união muito íntima e pessoal, no caso de Maria, esta alcança uma profundidade maior, porque implica uma doação recíproca e total ao próprio Deus. Em sua materna presença na história redentora, tem como mãe a missão de formar Cristo nos crentes, não tendo nenhum interesse privado a não ser conduzir-nos nesse aprendizado que ela mesma fez em ser discípulo e discípula. Assim podemos compreender como esse dogma da maternidade mostra a dignidade única de Maria. Ninguém recebeu nem receberá semelhante dom. Mas tal dignidade não a separa de nós. Ela é a Mãe de Deus e nossa. Se o amor do Pai nos foi manifestado na humanidade do Filho, esse amor aproxima-se também de cada um de nós através dessa Mãe que comunga o mesmo querer de Deus para nós. Que assim seja.
No nosso próximo encontro meditaremos o dogma da Virgindade perpétua. Grande abraço.