Chegamos
ao final de nossa caminhada pelos textos bíblicos das figuras inspiradoras que
compõem o universo de reflexões em torno da Virgem Mãe. Tomamos como base o
livro de Gianfranco Ravasi “Os Rostos de
Maria na Bíblia” e algumas anotações de Angel L. Strada em seu livro “Maria: Um exemplo de Mulher”.
Continuaremos o nosso itinerário através de outros autores e suas reflexões,
aqui sintetizadas para compor esse mosaico que estamos construindo na tentativa
de, pela contemplação do mesmo, tenhamos uma melhor compreensão de Maria no
plano salvífico e de como nossa devoção mariana pode ser melhorada em sua
comunhão com a fé da Igreja.
Fora
desse mundo bíblico e reflexivo do magistério da Igreja encontramos muitos
escritos que, de certo modo, alimentaram a devoção mariana através de imagens
de grande fascínio, com alguma pitada histórica, mas também deformadas e
ilusórias. É nesse terreno que encontramos os escritos apócrifos. Alguns
descrevem a infância de Maria como a de Jesus, como alguém que se comporta como
um adulto, como quem já sabe o que lhe espera (Pseudo-Mateus). Claro que todos
esses escritos tentam preencher uma lacuna deixada pelos Evangelhos canônicos.
O mais popular desses textos é certamente o Apócrifo de Tiago que remonta as
reminiscências da origem de Maria ao citar seus pais (Joaquim e Ana) que entram
no rol dos santos da Igreja. Focado na natividade de Maria, também nos trás uma
série de pormenores do nascimento de Jesus. As celebrações da natividade de
Maria e sua apresentação no templo foram inspiradas nesse texto tanto para o
Oriente como para o Ocidente.
Segundo
esse mesmo Protoevangelho de Tiago, Maria teria ficado no Templo até os doze
anos, alimentada pelos anjos. Ao chegar o período da menstruação, para não contaminar
o templo, a menina teria que deixa-lo. Para isso foi escolhido um grupo de
viúvos (outros apócrifos falam de solteiros), dos bastões que estes traziam, um
deveria florir como indicação de quem deveria cuidar da menina. Esse bastão é o
do velho e humilde José. Assim podemos compreender algumas imagens que trazem
um José já envelhecido com o Menino nos braços. Para os Orientais seria mais
razoável crer que José fosse um velho e tutor de Maria a ser um jovem
carpinteiro que a desposara, para resguardar a virgindade da mesma. Mas outros
textos falam de um casamento com José e uma série de outras informações que
podemos até vislumbrar nos filmes que tentam narrar a infância de Jesus e os
primeiros anos de convivência entre Maria e José, até o anúncio do anjo
Gabriel.
O
mundo criativo e imaginativo dos apócrifos carrega na tinta aos descrever
outros episódios da vida de Jesus, tal como a fuga para o Egito, uma infância
marcada por eventos mirabolantes, mas que tem a ver com o futuro Messias. Mas
um detalhe deixado de lado pelos Evangelhos canônicos e longamente descrito
pelos apócrifos é o encontro de Maria com seu Filho após a ressurreição, com os
apóstolos. Tratam também do seu fim terreno, do seu sepulcro e da sua elevação
ao céu, exaltando a Assunção de Maria à imagem do Filho, abrindo caminho para o
dogma da Assunção em 01 de novembro de 1950. Essa verdade professada pela
Igreja quer refletir sobre o mistério ‘pascal’ de Maria. Trataremos dos dogmas
marianos mais adiante.
Para
além desse mundo de textos apócrifos que alimentou a piedade e a religiosidade
popular, está uma reflexão teológica que buscamos fazer a partir dos textos
bíblicos, partindo do Antigo Testamento, onde ela se encontra “profeticamente
oculta” (LG 15) passando pelo novo e pela Tradição eclesial, o mais importante
de tudo isso é o que encontramos no Novo Testamento e já salientado pelo
Vaticano II: uma peregrina na e da fé.
“Como gostaria de ter sido sacerdote
para pregar sobre a Virgem Maria! Parece que me teria bastado uma única vez
para fazer compreender o meu pensamento acerca dela... Seria preciso dizer que
ela vivia da fé como nós’. Era assim que santa Teresa do Menino Jesus exprimia
o seu desejo de testemunhar o seu amor pela Virgem e de imediato identificava
uma componente fundamental – muitas vezes menosprezada por muitos pregadores
habilitados – a componente da fé”
(Gianfranco Ravasi - Os Rostos de Maria
na Bíblia – Paulus).