“De alegria vibrei no Senhor, pois
vestiu-me com sua justiça. Adornou-me com joias bonitas, como esposa do Rei me
elevou”.
Abrimos
nossa primeira reflexão desse ano e a última dos textos referenciais do Antigo
Testamento, com o refrão desse canto
litúrgico para as festas marianas de nossa Igreja, muito cantado no passado. Na
base de sua inspiração estão os textos de Is 61,10; 62,5, que parece ter
inspirado o Magnificat de Lucas em sua abertura. O texto fala de Jerusalém, que
personifica essa ‘esposa’ que ergue a Deus (esposo/rei) o seu hino de louvor e
de ação de graças.
O texto
trabalha a simbologia da ‘veste’ (‘vestir’, ‘envolver-se’, ‘adornar-se’), mas a
veste é de salvação. A simbologia nupcial se faz presente, já tão bem
trabalhada em outros textos (Oseias, Ezequiel, Cântico dos Cânticos), aqui
trata-se de uma festa nupcial de caráter real. “A dimensão festiva, que tem conotações messiânicas, brilha no início do
poema, que se mostra aparentado com o de Ana, já examinado: ‘O meu coração
exulta no Senhor..., alegro-me pelos benefícios que nos concedeu’ (1Sm 2,1). A
este princípio do poema fará eco também o Magnificat: ‘O meu espírito exulta em
Deus meu Salvador’ (Lc 1,47). De Deus brota a alegria salvífica, dele nasce a
esperança num horizonte novo e luminoso, nele tem origem o amor nupcial que
ligará a Sião e a Israel” (Gianfranco Ravasi – Os Rostos de Maria na Bíblia – Paulus).
É partindo
desse sentido de uma relação íntima que se estabelece entre Deus e Sião, pois
fala de nupcialidade e fecundidade, que se aplica uma chave mariana, a quem o
anjo convida a alegrar-se e que será envolvida pela “sombra do Altíssimo” (Lc
1,35). A sua maternidade divina gera salvação (Lc 1,69.77; 2,30). O seio de
Sião, sinal de fecundidade sagrada, torna-se o seio de Maria da qual nasce a
Vida mesma, o Rebento Messiânico (Lc 1,42).
O texto que
certamente já ouvimos em alguma liturgia mariana compreende Is 61,1-5. Assim
temos esta última imagem de Maria, convidada a viver essa entrega ao seu Deus,
como uma esposa, eleita, preferida. “Saudemos,
então, Maria Esposa e Mãe, no final desta primeira galeria de quinze ícones
delineados com cores transfiguradas do Antigo Testamento: Maria, nova Eva;
Maria, sarça-ardente e inextinguível; Maria, nova Débora; Maria, velo de
Gedeão; Maria, nova Rute; Maria, nova Ana; Maria, arca da nova Aliança; Maria,
filha de Sião; Maria, nova Judite; Maria, nova Ester; Maria, Esposa e Mãe”
(Gianfranco Ravasi – Os Rostos de Maria
na Bíblia – Paulus).
Encerrando
essa etapa e abrindo-nos ao Novo Testamento e a um novo ano que se inicia,
transcrevo aqui a oração de D. António Couto, que pede à Virgem a bênção para o
novo ano: “Mãe
de Deus, Senhora da Alegria, Mãe Igual ao Dia, Maria. A primeira página do ano
é tua, Mulher do sol, das estrelas e da lua, Rainha da Paz, Aurora da Luz,
Estrela matutina, Mãe de Jesus e também minha, Senhora de janeiro, do Dia
Primeiro e do Ano inteiro. Abençoa, Mãe, os nossos breves dias. Ensina-nos a
vive-los todos como os teus, sempre sob o olhar de Deus. É verdade. A grande
verdade da tua vida, o teu segredo de ouro. Tu soubeste que Deus velava por ti,
enchendo-te de graça. Mas tu soubeste sempre olhar por Deus, porque tu soubeste
bem que Deus também é pequenino. Acariciada por Deus, viveste acariciando Deus.
Por isso, todas as gerações te proclamam ‘Bem-aventurada’! Por isso, nós te
proclamamos ‘Bem-aventurada’! Senhora e Mãe de janeiro, do Dia Primeiro e do
Ano inteiro. Acaricia-nos. Senta-nos em
casa ao redor do amor, do coração. Somos tão modernos e tão cheios de coisas
estes teus filhos de hoje! Tão cheios de coisas e tão vazios de nós mesmos e de
humanidade e divindade! Temos tudo. Mas falta-nos, se calhar, o essencial: a
tua simplicidade e alegria. Faz-nos sentir, Mãe, o calor de tua mão no nosso
rosto frio, insensível, enrugado, e faz-nos correr, com alegria, ao encontro
dos pobres e necessitados. Que seja, e pode ser, Deus o quer, e nós também
podemos querer, um Ano Bom, cheio de Paz, Pão, amor, para todos os irmãos que
Deus nos deu! E que Santa Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe nos abençoe também.
Amém” D. António Couto.